terça-feira, 2 de março de 2010

NAQUELE DIA, NÃO AGUENTOU E MATOU O VIZINHO

Aquele dia seria complicado pra ele. Há 3 dias que praticamente não dormia. Naquela manhã teria uma conversa definitiva com o diretor do banco. Banco que sua família ajudara a fundar. Mas agora , ele afundando, o crédito sumiu e as dívidas se amontoavam.
Olhou pra mulher na cama que, linda e sensual, dormia em pequenas sedas e rendas. Nem desse privilégio ele conseguia mais usufruir. O desejo é amigo do sossego. Um vai embora o outro vai junto.
Fez a barba . Não por vaidade nem por necessidade social, pois já havia assumido pro mundo a aparência de "looser" que lhe cabia naquele momento. Fez a barba porque aquela talvez fosse a única novidade do dia.
Ligou a tv no noticiário . O Mundo caindo, o mar subindo, a Europa falindo e os trouxas sorrindo. Um comercial de carro japonês de última geração passou 3 vezes no mesmo intervalo comercial do Jornal da manhã. Na hora lembrou do seu, que talvez não pegasse de primeira. Dia frio e a partida eletrônica quebrada. R$1.800,00 pra consertar. Dinheiro de zona em outras épocas, hoje uma pequena fortuna. Pensou na terrível possibilidade de naquele dia encontrar o vizinho arrogante e que estava de olho na sua mulher desde de que se mudaram. Um Vizinho solteiro, dono de várias empresas , que dava festinhas em dia de semana que atravessavam a madrugada, regadas a espumante e hip hop Americano de mau gosto. Aquele que sempre tinha uma piadinha pronta sobre dinheiro. Eram conhecidos de infância. Inimigos velados. Seus pais foram sócios num grande negócio, que, pra piorar, acabou virando parte da herança do tal vizinho playboy.
O Café estava fraco e frio. A empregada fiel foi a última a abandonar o barco. A mulher acorda como nos velhos tempos, linda e despenteada. Bocejando com um meio sorriso de bom dia. Como se a vida náo estivesse desmoronando. E pra ela náo estava mesmo. Já havia mudado conceitos e abandonado o excesso de bagagem que a luxúria vazia da alta sociedade cobrava como ingresso. Vivia com simplicidade, fazia yoga no condomínio, nadava, levava o filho pequeno pra creche e ia trabalhar, tranquila e serena. O que a deixava cada dia mais atraente.
Era hora de ir pro banco com aquela alegria de um boi que vai pro matadouro, Enquanto tranca a porta ouve o vizinho saindo ao mesmo tempo. Tentou entrar de volta mas já era tarde. Ao lado do rapaz, uma oriental de uns 19 anos, linda , com o sorriso de quem gozou numa noite o que as mulheres chinesas de sua família não gozaram nas últimas 10 gerações por repressão ou por preguiça. No elevador um sonoro bom dia e a primeira pergunta já irrita. Óbvio, era sobre como iam os negócios. E antes da resposta óbvia , o vizinho se antecipa e conta sobre seus novos parceiros de importação no Oriente médio, sobre negócios no vale do silício e sua estratégia pra ganhar seu próximo milhão de Euros.
Chegam na garagem, e o carro não pega. Vira a chave de novo. Nada. Olha pro lado e o Vizinho, que trocou de carro e agora tem aquele da empresa japonesa do comercial da TV da porra do noticiário, faz a pergunta fatal, que nunca deveria ter feito::
- E sua mulher, como está? Encontrei ela outro dia na piscina do prédio. Você é um cara de sorte né? .
Era a gota d'água. Ele sai do carro e sobe a escada correndo. Entra em casa arrancando a porta. A mulher, na varanda tomando café, se assusta. Ele derruba o café das mãos da mulher, afunda uma mão na sua cintura e outra nos cabelos. Morde seus lábios como um vampiro sedento, enquanto se encaixam frenéticos e adolescentes, sem vergonha de quem estiver no prédio em frente. O Vizinho saindo da garagem vê os dois se atracando na varanda, já arrancando as roupas mirando a direção do quarto. Naquele dia ele matou o vizinho. De raiva.

MARCELO MIRA

Um comentário:

  1. O importante e ser feliz de repente, agora para sempre.(Cazuza).
    Frustações, perdas,carências é tudo superável.
    Estar vivo e inteiro sempre será o fundamental.

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